Se o cinema brasileiro fosse um boteco sujo na boca do lixo, “Os Sete Gatinhos” seria aquele tira-gosto duvidoso que você come porque já está bêbado demais para questionar. Dirigido por Neville D’Almeida e baseado na peça de Nelson Rodrigues – o mestre supremo da putaria psicológica – esse filme é um verdadeiro espetáculo de mau gosto, hipocrisia social e uma quantidade de perversidade que faria um padre ter uma síncope.]
O Contexto: Nelson Rodrigues, Neville D’Almeida e a Boca do Lixo
Para entender “Os Sete Gatinhos”, é preciso entender o momento em que foi produzido. Nelson Rodrigues, gênio maldito do teatro e literatura brasileira, criou um universo onde a hipocrisia da classe média é despida sem dó nem piedade. Suas histórias eram carregadas de incesto, adultério, assassinato e fanatismo religioso, sempre expondo o lado mais podre do Brasil.
Neville D’Almeida, por outro lado, era um diretor que adorava o choque. Criado na efervescência da Boca do Lixo, o centro da produção cinematográfica marginal e erótica de São Paulo, ele dirigiu algumas das pornochanchadas mais exageradas e debochadas do período. “Os Sete Gatinhos” foi filmado nos anos 80, quando a ditadura militar ainda dava seus últimos suspiros, e o cinema nacional era um reflexo esquizofrênico do Brasil: entre o erotismo barato e a crítica social travestida de escracho.
Ou seja, não espere sutileza.
Enredo: família tradicional brasileira versão inferno
A trama segue a família Noronha, um bando de desequilibrados que fariam a família do “Massacre da Serra Elétrica” parecer os Ursinhos Carinhosos. O patriarca, Seu Noronha (Lima Duarte, com a dignidade de um figurante de filme pornô falido), é um burocrata frustrado que finge ser um exemplo de moral enquanto as filhas literalmente vendem o próprio rabo para bancar o enxoval da caçula, Silene (Cristina Aché, com a mesma expressão facial de um manequim queimado).
E qual o problema dessa caçula? Além de ser a queridinha da casa, a jovem delicada e pura tem um pequeno deslize: MATA UM GATO A FACADAS NA ESCOLA. Sim, do nada, no meio da trama, rola essa cena que faz até filme de terror parecer coisa de criança. O bichano vira um sacrifício satânico gratuito, e Neville filma isso como se fosse um comercial de margarina. Só que ao invés de café da manhã em família, temos sangue e miados de agonia.
Ah, e pra piorar, a própria Silene já não é tão inocente quanto a família imagina. Na verdade, ela tem um lado demoníaco e manipulador que coloca a casa inteira de cabeça pra baixo. O que parecia um sonho de manter a virgindade da menina pura e imaculada acaba virando uma tragédia moral digna de um pesadelo filmado em VHS.
Personagens: Um Show de Psicopatia com Saldo Negativo
- Seu Noronha: O típico tiozão que condena a libertinagem mas tem um histórico de assédio que daria um documentário da Netflix. Em um momento icônico, ele entra no banheiro e solta a lendária frase: “Quem desenhou caralhinhos voadores na parede do banheiro?”. A família inteira nega, e fica aquele climão como se ele tivesse acabado de perguntar quem matou o Kennedy.
- Silene: A garotinha mimada e diabólica que vai de santa a Satã em tempo recorde.
- As irmãs: Regina Casé e companhia fazem das tripas coração (literalmente) para interpretar prostitutas que financiam o sonho virginal da caçula. Um belo exemplo de capitalismo selvagem dentro do próprio lar. Em uma das melhores cenas, Regina Casé foge de um cliente na piscina, gritando “Não vai me comer!” enquanto tenta escapar desesperadamente como se estivesse fugindo de um tubarão tarado.
- O Namorado da Silene: Descobrimos que o cara tem uma assinatura premium no “pacote família” do bordel caseiro. Só no Brasil mesmo.
- A Gorda: Porque todo filme brasileiro dos anos 80 precisava ter uma personagem gorda sendo tratada da maneira mais cruel possível. E aqui, claro, não é diferente. O filme não economiza na escrotidão ao retratá-la como alguém que só serve de escada pra piada ruim.
Cenas Memoráveis: ou como surpreender um tarado acidental
- O Assassinato do Gato: Se você achava que esse era só mais um filme sujo e pervertido, toma aqui um ritual de violência gratuita para traumatizar os amantes de pets.
- O Jantar do Inferno: A sequência final reúne toda a família em um festival de revelações bombásticas, agressões e uma catarse que faz o final de “O Iluminado” parecer episódio de “A Grande Família”.
- A Suruba Necrofílica (?!): Porque Nelson Rodrigues não sabe brincar. Se tem um cadáver no recinto, alguém VAI fazer algo imoral com ele.
- A Reviravolta Final: Porque se já não fosse absurdo o suficiente, o desfecho vem com um gosto amargo de moralidade distorcida, onde ninguém sai ileso. Nem o espectador.
Conclusão: uma pornochanchada possuída pelo demônio
“Os Sete Gatinhos” é aquele tipo de filme que te faz rir, chorar e questionar sua sanidade em menos de duas horas. É trash, é sujo, é desconfortável, e ainda assim, impossível de ignorar. O cinema brasileiro nunca teve medo de chafurdar na lama, mas aqui Neville D’Almeida praticamente mergulha de cabeça e sai rindo com a boca cheia de barro.
Se você gosta de filmes que parecem um cruzamento incestuoso entre pornochanchada e filme de terror experimental, essa obra é um presente envenenado para sua coleção. Se não gostar, pelo menos pode dizer que viu um dos maiores desastres cinematográficos do Brasil e sobreviveu para contar a história.
Nota final: 10/10 para o choque, 2/10 para a decência, e um minuto de silêncio pelo gato, a única vítima real dessa bizarrice.
Ah, e se você curte esse tipo de podridão cinematográfica, dá uma olhada na minha loja, Brazuca Trash Store. Camisetas temáticas de terror trash/B que fariam até Nelson Rodrigues sentir vergonha.